Projeto DOSVOX Novos horizontes para os deficientes visuais


O que muda na vida de um deficiente visual com a tecnologia de computação

A modificação das relações entre deficiente visual e a cultura pode ser definida com uma única frase:
"um cego agora pode escrever e ser lido e ler o que os outros escreveram".

Explicando melhor:

a) a leitura e escrita das pessoas cegas, tradicionalmente, se faz através do sistema Braille. Entretanto, raríssimas pessoas que enxergam conseguem ler ou escrever Braille (muito menos com fluência). Isso isolava as pessoas cegas num gueto cultural: um cego só escrevia para outro cego ler.

b) ao precisar ler um texto com escrita convencional, era necessário alguém que traduzisse para Braille ou lesse o texto, provavelmente gravando em fita cassete.

c) embora uma pessoa cega pudesse escrever à máquina, o resultado quase sempre era ruim, pois era muito difícil corrigir ou escrever um texto, parar e depois voltar a escrever.

A tecnologia de computação tornou possível o rompimento dessas barreiras e muitas mais.

Em síntese, o acesso à cultura atinge níveis espantosamente melhores do que há poucos anos atrás.


O DOSVOX, neste contexto de imensa evolução tecnológica, é um artefato realmente importante?

O projeto DOSVOX é uma cunha que abriu novos espaços a uma parte importante da população brasileira, que tem um potencial imenso a ser explorado, caso lhes sejam fornecidas as ferramentas e oportunidades convenientes. É inegável que com a disseminação do sistema DOSVOX, que é o mais adaptado à realidade da imensa maioria dos deficientes visuais do Brasil, essas pessoas tornaram-se mais produtivas e em quase todos os casos, indivíduos mais integrados à sociedade.

O sistema DOSVOX foi criado utilizando tecnologia brasileira, adequada às necessidades e especificidades dos deficientes do Brasil e de países que não são ricos. Em particular, o impacto do sistema DOSVOX sobre os deficientes visuais brasileiros é imenso, e isso foi centenas de vezes constatado e divulgado pelos jornais, rádio e TV.

O DOSVOX não resolve todos os problemas, mas ajuda a resolver muitos deles:

O DOSVOX pode ser visto como uma ferramenta sem a qual as coisas ficam muito mais difíceis para o deficiente visual. Entretanto, para que ela possa continuar a ser efetivamente importante, são necessárias ações continuadas, e que sejam aplicadas ao maior número de deficientes visuais do nosso país. Isso depende do esforço de todos: é um esforço social e político, nunca dissociado do esforço de desenvolvimento técnico.


Algumas ações necessárias para a modificação da vida dos deficientes visuais

Organizamos a seguir diversas situações em que o uso do sistema DOSVOX pode ser a chave da solução para os problemas do portador de deficiência visual. São propostas as ações que trabalham no equacionamento dessas situações.

a) formação da criança e jovem deficiente visual

A formação da criança e jovem cego é muito prejudicada por falta de acesso a recursos, tecnologia e cultura. É até possível colocar um cego numa classe comum de escola, porém os livros são todos impressos em papel. Nessas circunstâncias, o aluno pode utilizar a tecnologia Braille para copiar e fazer seus trabalhos escolares, mas isso esbarra em pontos chaves:

Por outro lado, com o uso do DOSVOX o aluno pode fazer seus trabalhos sendo facilmente compreendido pelo professor. O DOSVOX, acoplado a um aparelho de "scanner" e com o uso de um programa de "Optical Character Recognition" (O.C.R.) pode ler textos em papel. Muitas informações complementares podem ser buscadas na Internet e lidas com o DOSVOX.

Ação:

Disponibilizar equipamentos de computação com o DOSVOX à comunidade estudantil, configurados convenientemente, com acesso a Internet e com scanner. Isso é economicamente viável, especialmente se pensarmos em centralizar alguns equipamentos em locais de acesso público, como escolas, centros de atendimento e convivência de deficientes (como os preconizados pela Rede Saci) e em bibliotecas públicas. Alguns desses centros poderiam dispor também de uma impressora Braille, para permitir a impressão de material específico, sob demanda.

b) dificuldade de acesso a leitura

A dificuldade de leitura, visto no item anterior, e fundamental no estudo, acompanha sempre o cego. Por exemplo, uma pessoa que tenha ficado cega, e que já tenha uma profissão, tem totalmente tolhido seu desenvolvimento profissional. O acesso a jornais impressos só é possível via uso de "ledores", termo que designa os leitores voluntários.

Ação:

Como todos os jornais, revistas e livros hoje são produzidos por computador, um disquete com um texto qualquer poderia ser lido pelo DOSVOX.

A tecnologia de impressão braille, um dos pontos fortes do sistema DOSVOX permite também que livros sejam impressos em Braille. Aproveitando uma lei específica, que garante a transcrição sem pagamento de direitos autorais, é possível transcrever qualquer livro para Braille através do DOSVOX. Embora sujeito a algumas controvérsias, aceita-se como uma opção dentro da legalidade a transcrição de textos exclusiva para leitura em computador por deficientes visuais.

O Ministério da Educação e Cultura, por exemplo numa ação digna de todos os aplausos, tem promovido a transcrição dos livros didáticos adotados no Brasil para Braille, através dos Centros de Apoio Pedagógicos (CAP), em todo Brasil. É um trabalho gigantesco, mas é um investimento com frutos garantidos.

Os problemas dessa ação se relacionam à dificuldade de conscientização dos editores da importância social de tal ação, pois embora a disponibilização dos textos em forma digital não acarrete despesa (uma vez que os textos já são digitalizados), provavelmente também não dará lucro comercial, pois o número de exemplares vendidos será pequeno.

É importante tornar viável a transcrição de livros para a forma digital, voltada para uso nas bibliotecas públicas, de forma que um deficiente visual possa transcrevê-la para Braille ou escutá-la sendo sintetizada em voz pelo sistema DOSVOX.

c) Os deficientes visuais não têm acesso a informações basicas para convivência social

É extremamente difícil para um cego ter acesso a informações absolutamente triviais, tais como preço de mercadorias, número de telefone, cardápios, orientações do espaço público, caixa automática bancária, etc. Por outro lado, a tecnologia informática cada vez mais domina o acesso do usuário à informação.

Ação:

Prover nas soluções tecnológicas o acesso sonoro, possivelmente utilizando a tecnologia do DOSVOX, que é aberta, e que pode ser facilmente adaptada a estes equipamentos.

As dificuldades desta ação têm a ver especialmente com conscientização dos produtores de que a tecnologia existe e é viável de ser usada, e dos compradores da tecnologia que devem solicitar que tais facilidades sejam colocadas. É importante lembrar que muitas "features" dos sistemas computadorizados são meras "firulas" para atrair o usuário, e um sistema falado pode ser um elemento altamente atrativo. Qualquer microcomputador pode falar.

d) Os deficientes visuais fora das capitais do Brasil não têm acesso a nada

Virtualmente todas as ínfimas facilidades para deficientes visuais estão localizadas nas capitais. Um cego que nasça no interior é um alijado da cultura.

Ação:

Através da ação de espalhar nas bibliotecas das pequenas cidades do interior microcomputadores, que, entre outras coisas, poderiam servir para as pessoas cegas terem acesso aos disquetes gerados nas bibliotecas das capitais, se poderia levar a cultura ao cego de cidades médias do Brasil. Em especial, via Internet, os arquivos das bibliotecas das grandes cidades poderiam ser transportados para as cidades menores.

As dificuldades deste processo referem-se à coordenação das interações entre bibliotecas, uma vez que praticamente todas as cidades médias, hoje em dia, já estão equipando suas bibliotecas com microcomputadores. Como o DOSVOX é gratuito, não introduz ônus neste processo além do treinamento a ser realizado nos bibliotecários.

Um possível modelo a seguir é o que vem sendo adotado em algumas cidades do Brasil, onde pessoas cegas montam pequenas estruturas onde ensinam a tecnologia DOSVOX (entre outras) para deficientes visuais, coordenando este trabalho com as bibliotecas públicas.

e) Os deficientes visuais poderiam ser muito mais produtivos se tivessem ensino profissionalizante adaptado.

Existem uma série de atividades, que poderiam ser perfeitamente realizadas por deficientes visuais, com preparo de nível médio, com uso do computador. Alguns desses exemplos são as atividades de telemarketing, atendimento de reclamações por telefone, recepcionista, etc. Essas atividades, naturalmente exigem um treinamento, por razões óbvias.

Devido ao despreparo do cego em atividades específicas, existem muito poucos postos de trabalho disponíveis nas empresas.

Ação:

Através da tecnologia DOSVOX (entre outras), muitas oportunidades de profissionalização podem surgir. Essa profissionalização poderia ser feita tanto nas instituições destinadas a ensino de cegos, mas principalmente, nas próprias empresas, da mesma forma que é feita para funcionários comuns.

f) o uso de computador pode dar novas oportunidades ao pessoal adulto que fica cego.

Existem milhares de pessoas que adquirem cegueira depois de adultos, em muitos casos, depois de estarem formados. Causas variadas, desde doenças até acidentes, retiram do mercado de trabalho centenas de pessoas por ano. Essas pessoas, muitas vezes, têm uma importância grande na sociedade, são técnicos, profissionais liberais, médicos, advogados, engenheiros, que se vêem privados de meios para produzir e para subsistirem condignamente.

Ação:

Viabilizar o retreinamento das pessoas que ficam cegas, ensinando-lhes durante o período de reabilitação, o que a tecnologia pode fazer em cada caso. O simples acesso à informação que a tecnologia existe e está disponível, viabiliza nas pessoas mais cultas o retorno quase imediato às atividades anteriores ou a iniciativa de adaptação destas atividades às restrições impostas pela tecnologia existente. Em última análise, isso representa a reintegração muito mais rápida do indivíduo à sociedade.

Pelo fato que o DOSVOX é uma tecnologia aberta, ele pode ser usado e adaptado para uso em um sem número de atividades. Um exemplo extremo, é o de músicos cegos produzindo música por computador usando programas profissionais, acionados via DOSVOX.

g) todo cego deveria ter acesso à "aldeia global"

As telecomunicações são uma realidade dos tempos atuais. O transporte de informações através da rede telefônica, interligada à rede mundial de informações (Internet), utilizando tecnologia de redes e de satélites, viabiliza o transporte de informações quase instantâneo a qualquer um que disponha acesso à Internet, serviço prestado a um custo razoavelmente pequeno.

Para o deficiente visual, o acesso às informações via rede, viabiliza a obtenção e troca de informações em geral, como a acesso aos jornais e revistas, troca de mensagens, correio eletrônico, informações bancárias, etc...

Ação:

A tecnologia DOSVOX incorpora o acesso às telecomunicações através da Internet. O que seria desejável é um tratamento diferenciado de tarifas para o uso do deficiente às telecomunicações.

Instituições públicas poderiam (a exemplo da UFRJ) sediar listas de discussões, sites de bate papo, bibliotecas virtuais especializadas, etc. Desta forma, o deficiente visual ampliaria os seus horizontes culturais, de diversão, e de participação na comunidade global.

h) instituições tradicionais não têm meios que facilitem o acesso à tecnologia

Ter acesso à tecnologia implica mais do que comprar computadores: o material humano é o item principal. Difundir a tecnologia para as instituições que já existem é um desafio a ser vencido, uma vez que muitas vezes a mudança para incorporar a tecnologia representa um esforço que estas não estão dispostas a fazer.

Ação:

É fundamental favorecer a instalação de equipamentos e treinamento nas instituições de atendimento a deficientes que sejam comprovadamente idôneas.

As empresas (em especial as empresas públicas) podem ter papel importante, no sentido de incentivar que os deficientes que freqüentem estas instituições tenham obrigatoriamente treinamento profissionalizante direcionados para as necessidades imediatas dessas empresas, viabilizando desta forma oportunidades de estágio ou emprego ao pessoal treinado nas instituições de atendimento.

i) o cego e a universidade

Atualmente na UFRJ existem menos de 10 (dez) deficientes visuais em cursos de graduação e pós-graduação . A causa desse pequeno número pode ser explicada por problemas sócio-econômicos do país que atingem a população de baixa renda impossibilitando-os de ingressar nas universidades, e dos poucos recursos encontrados para a formação dessas pessoas. A dificuldade é ainda maior à medida que o grau de especialização aumenta. Falta a eles literatura especializada, equipamentos e monitoria especial.

Ação:

A universidade tem sempre atuado como o centro de produção de tecnologia. As indústrias buscam suas soluções em pesquisas desenvolvidas dentro das universidades. Assim, ela tem gradativamente conseguido papel de destaque dentro da sociedade. O que se propõe agora é a utilização dessa tecnologia já produzida no auxílio aos deficientes.

Assim, o papel da universidade passa a ser não apenas o de desenvolver tecnologia, mas de desenvolver com humanidade. O auxílio ao deficiente pode ser encarado como um investimento a médio prazo, que acarretará em retorno de novas tecnologias para a própria sociedade produzida agora pelos próprios deficientes. Essas novas tecnologias podem ser reaplicadas, produzindo então um ciclo que se auto impulsiona.

j) necessidade de informação aos especialistas em computação sobre as possibilidades dos deficientes visuais em atividades que envolvam acesso a computadores

A tecnologia de síntese de fala e a acessibilidade aos computadores existe e funciona, não apenas no DOSVOX mas em muitos outros sistemas. Entretanto os responsáveis técnicos dentro das empresas não sabem como lidar com um deficiente visual que eventualmente precise usar tais acessos "diferenciados" ao computador.

Um técnico de informática comum, por exemplo, não sabe instalar e configurar um computador de uma pessoa cega, para que esta pessoa possa explorar o máximo de seu potencial. Não sabe também orientá-la nas opções disponíveis.

Ação:

É importante promover treinamentos e publicações em que a tecnologia seja explicada para que possa, em curto espaço de tempo ser dominada pelo pessoal técnico.

As instituições de ensino deveriam gerar material didático, sites, informativos, programas de treinamento, etc, visando que mais profissionais de computação pudessem ter acesso às especificidades da computação realizada através de programas adaptativos.


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