Labirinto Existencial.


LABIRINTO EXISTENCIAL

*** Um grande escritor russo, cujo nome não me recordo agora, afirmava: "existe no interior de todo homem um espaço do tamanho de Deus"... No decorrer de minha existência, venho fazendo incursões pelos mais variados credos, doutrinas, seitas, sempre à procura de estabilidade espiritual, quietude de alma ou qualquer coisa que o valha. Quem sou eu? De onde vim? Para onde vou? Estas perguntas sempre fustigaram meu eu em diversas fases de minha vida. Fui criado na igreja católica apostólica romana, porém, desde a adolescência, perdi o vínculo com a Santa Madre Igreja. Um colega dos tempos do Instituto Benjamim Constant ( o cara mais gago que já tive contato), era espírita e cismou de converter-me a esta doutrina. por aquele tempo, eu andava mergulhado em escaramuças metafísicas, procurando respostas para perguntas comuns, um alvo fácil para os empreendedores religiosos. foi assim que depois de algumas tentativas, meu amigo convenceu-me a ir a um centro espírita por ele frequentado. numa tarde chuvosa de sabado, pegamos um onibus que percorreu uma longa distância até chegarmos ao Centro. Ao entrarmos, fui apresentado ao diretor e á sua esposa que, para minha surpresa, eram cegos. Ela o ajudava nas preces, interpretações das mensagens, nos passes etc. Tudo aquilo era muito complicado para mim, um neõfito naquele ambiente. O meu amigo solícito tentava deixar-me à vontade. O medium deu por aberto a sessão. A mulher do diretor e medium foi escalada por ele para interpretar as mensagens/visões do dia. Ela começou: "Estou " vendo" uma senhora gorda de cabelos brancos que está rindo e acenando; acho que ela desencarnou há pouco tempo". Nesta altura entrava o diretor: "Alguém dos presente conhece esta senhora?" - É a minha mãe, gritou alguém emocionado no fundo da sala. Eu acompanhava tudo impressionado, enquanto a mulher continuava: "Está aqui agora, um senhor mulato, comprido,careca, muito machucado e com uma fisionomia triste". O medium perguntava: "de quem é ele?" - " É o meu irmão Erondino, coitadinho, foi um caminhão de cimento, gemeu uma senhora ". No meu lugar, paralizado, minha cabeça entrava em parafusos. O ritual continuava: "Agora, está bem aqui um senhor de idade, de cabeça branca, muito gordo, que tem um dente de ouro. Ele está caminhando pela sala bastante inquieto". - Vejamos, de quem é este irmão? -"é o finado Vitorino. Meu deus! É o meu velho, morreu de enfarto, há seis meses", gemeu uma velha, sentada ao meu lado. A mulher ia fundo: "Estou " vendo", agora, uma senhora de meia idade, de ar muito triste, com uma perna maior do que a outra e querendo falar algo". Ao meu lado, meu colega, estremeceu, resmungou qualquer coisa ininteligível e gritou em prantos: " louvado seja nosso senhor jesus cristo ! É a pobrezinha da tia Zumira. Eu sabia que ela vinha hoje!". No meu canto, confuso, desnorteado e assustado, eu tinha dificuldade até para respirar. Enfim, terminou a sessão. Pegamos o ônibus de volta ao casarão da Praia Vermelha e meu amigo, ainda muito emocionado, grunia explicações para mim sem perceber que eu havia entrado em um labirinto existencial. Ao chegarmos no Instituto, tomei banho e tentei dormir. Quando consegui, tive um pesadelo dígno da lavra de Freud. Sonhei que estava em um grande auditório, todo branco, e assistia a um coral de surdos que deu lugar a um balet de "pernetas", seguido por um show de strip tease com mulheres corcundas, banguelas e caolhas. Acordei sobressaltado e, em meu pesadelo, não haviam cegos que enxergavam seres do além. Desde aquele dia nunca mais fui o mesmo... Valdenito de Souza (Rio de Janeiro, 1997) ***


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